domingo, 18 de julho de 2010

Do frio que não senti

O peso na consciência que me acompanha todos os dias, resolveu aparecer de novo. Agora, não pelas crianças que passam fome (essas me sensibilizam diariamente), nem pela jovem senhora de mais ou menos 30 anos que hoje jogou uma lata de coca cola pela janela da barca Rio-Niterói e seguiu como se nada tivesse acontecido (dessa eu sinto pena e temo pelo futuro do planeta onde os filhos e netos dela irão viver). Também não foi pelos crakudos que aos poucos tomam de assalto a praça da Cantareira (me acho muito insignificante para resolver o problema deles, mas confesso que toda vez que vejo sinto muita pena).

Hoje de novo me veio aquela sensação de que nunca estou no lugar certo quando as mais fantásticas experiências acontecem. As festas que vou e fui nunca foram as melhores. Mas as que faltei, sempre foram as mais fantásticas, mais descoladas, onde sempre estavam aquelas pessoas que nunca são vistas na noite. Nunca vi os melhores filmes. Assisti muitos, mas nunca aquele que aquela pessoa disse que assistiu e, apartir desse momento, uma nova página na história do cinema começa a ser escrita. Também nunca li os melhores livros, nunca li e nem escrevi os melhores textos.

Agora, não vi a maior onda de frio da história do Acre. Com todo mundo que conversei, o assunto era um só: o Acre era o novo Alaska e eu não estava lá pra ver. Pessoas que nunca tomaram cachaça resolveram colocar o preconceito de lado e se jogar com garra na mardita para aplacar o frio que assolava a Amazônia Sul-Ocidental. Todos os estoques de roupa de frio sumiram como pipoca de cinema no lançamento de filme da saga Crepúsculo. O eixo da terra estava mudando e eu, mais uma vez, não estava como testemunha ocular da história.

Para me recuperar, no entanto, só não quero presenciar a maior onda de calor da história do Acre, o calor de todo dia já me deixa feliz...

Eu não digo eu te amo depois da primeira taça de sorvete haagen daz

Acredito que algumas frases na vida tem o peso de um container. Talvez seja por isso, que eu não costume sair por ai distribuindo "eu te amo". Pode ser um dos inúmeros defeitos que carrego nessa bagagem da vida que já me faz pagar excesso, mas desconfio das pessoas que se autointitulam melhores amigos de infância desde a época que brincavam de massinha depois da primeira taça de sorvete ou de três ou quatro chopps.

Não acredito no riso muito fácil, nem nas declarações de amor que são cópias de cartões do smilinguido. Depois de 35 anos, minha cápsula protetora resistiria uma ida à lua, quanto mais uma falsa verdade dita com a cara de uma mentira completa. Assim como engenheiro acredita na base sólida do prédio, acredito que qualquer relação, incluíndo as de amizade, são construídas com o tempo, com a vivência de certas experiências que só com o tempo você pode guardar na memória.

Não sei bem porque, mas sinto que nem todas pessoas estão preparadas para dizer "eu te amo, meu amigo" de forma verdadeira. Acho, até, que algumas pessoas deveriam ser proíbidas de falar por ai tal frase. Quando você distribui um "eu te amo" numa hora indevida, quando chegar a hora certa ele já não terá siginificado, perderá o valor.

Nessa minha peleja dolorosa, tratando as palavras como "peixes abissais", vejo muito peso no que falo e ouço. Algumas frases não podem ser desgastadas. Dizer eu te amo não é como pedir um pãozinho na padaria de manhã ou trocar de camisa quando ela não combina com a calça.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Só pra constar: eu não sei falar do cosmos

O meu silêncio constante ganha contornos de silêncio de ginasta russo antes da competição de trave, quando o assunto ao meu redor começa a gravitar em torno do cosmos. Eu já tentei, já fiz cara de conteúdo, mas não dá. Se no meio de uma cerveja, o camarada ao lado começa a falar que existe uma energia que emana das ruínas de Marte e quando se encontra com os anéis de Saturno produz uma força cósmica que explica a nossa existência na terra, eu me calo ad infinitum.

Começo a acreditar que preciso me espiritualizar mais. Quem sabe virar produtor cultural, assessor de imprensa de um astrólogo famoso, mas algo precisa ser feito. Eu preciso acreditar que quando você sai de casa e vai para um bar, é culpa do cosmos. Ou quando o preço do tomate sobe, também é culpa do cosmos. Que esse tal de cosmos também tem culpa quando o saldo da sua conta corrente fica negativo, algo que sempre acontece a partir do décimo dia do mês. Posso não conhecer esse camarada, mas pelo visto ele tem uma disciplina digna de registro.

Talvez eu não queira mesmo é me aproximar de quem fala do cosmos. Quem tenta explicar tudo pelo cosmos. Essas pessoas parecem fugir de alguma verdade colocando a culpa nesse pobre coitado que às vezes não tem culpa de nada, mas é culpado por tudo.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Porra, tô feliz pakaralho com o futuro da humanidade

Passeando pelas ruas do Rio, às vezes me sinto navegando por um mar de palavrões. Em todo esquina que passo, em toda rua que ando, é uma profussão de porra e caralho que deixaria envergonhado os mais puritanos. Já percebi, nesses quatro meses, que o carioca fala palavrão com a mesma recorrência que deputado fala vossa excelência durante sessão na câmara dos deputados ou professor universitário usa vossa magnificência para se referir a reitor.

Percebo, que por aqui, ninguém é amigo, aqui o cara só é amigo quando é amigo pakaralho. Aqui a festa nunca foi simplesmente boa, aqui ela só é boa quando é boa pakaralho. Aqui você só está feliz, quando tá felizpaporra. A aula só é considerada boa, quando você sai e diz: porra, que aula boa. Isso quando três ou quatro palavrões não resolvem fazer parte da mesma frase, algo que também é comum, e ai você deixa de ser um simples amigo e vira um filha da puta amigo pakaralho.

Aqui no Rio, tenho a sensação que você pode fugir de uma bala perdida (confesso que nunca vi, e acho, por enquanto, que isso é criação de roteirista da Globo. Também não quero encontrá-las na próxima esquina), escapar de um assalto (esses já tive o desprazer de presenciar e continuo preferindo assistir a jogos da Copa do Mundo), procurar um atalho e fugir dos principais pontos de congestionamento da cidade, mas de ouvir palavrão pelo menos 100 vezes por dia, disso você não escapa.

Talvez seja pela quantidade de palavrões que o carioca expele diariamente, que ele seja tão feliz. Apesar do trânsito caótico, das cenas de violência e da vida agitada que o torna cego diante das belezas da cidade, o que ele quer mesmo é ver o expediente acabar. A partir desse momento, ele deseja apenas dividir uma cerveja na calçada de algum boteco e passar horas falando sobre a história de algum time de futebol com algum filha da puta amigo parakalho. Quem sabe, ainda, contar detalhes de um samba de raíz pra um filha da puta amigo pakaralho, que não entende porra nenhuma de samba.

domingo, 4 de julho de 2010

Não sou eu quem me navega, quem me navega é o mar

Nesse 35 anos de vida, a ansiedade tem sido uma marca constante da minha personalidade. Na ânsia de chegar mais rápido, sempre criei atalhos. Esqueci de curti a beleza da paisagen e me fixei apenas no ponto onde devia chegar, de preferência antes da hora marcada com o destino.

Parece que não tinha tempo de esperar a água secar na areia da praia para poder escrever meu nome. Agora que conheci os versos da música Timoneiro, de Paulinho da Viola, tenho repensando se vale apena lutar contra o tempo do tempo, quando essa será uma batalha onde o tempo sempre será o vencedor.

Não queria mais me navegar, mas deixar que o mar me navegasse. Mas ainda não sei como funciona o tempo da mudança. Na verdade, eu não sei como funciona o tempo, esse meu adversário constante em maratonas de longa e curta distância, contra o qual eu ainda não sei se coleciono mais vitórias ou derrotas.

sábado, 3 de julho de 2010

O elefante, a formiga, o Afeganistão e as metáforas que não consigo produzir

Se tem um tipo de gente nessa vida que merece o meu respeito, é quem consegue formular metáforas que suscitam a nossa curiosidade, mas pouco nos dizem. Acredito que esse dom seja para pessoas iluminadas, e ainda não consegui atingir esse nível de encantamento.

Fico intrigado com quem escreve, num mesmo texto, sobre o equilibrio desenvolvido de elefantes que habitam uma nação pouco conhecida da África e o avanço no consumo de livros de física quântica entre os estudantes do curso de Terapia Ocupacional. Eu não conseguiria, e admito a minha total incapacidade.

Talvez me falte mais cultura geral para atingir esse nível de produção em estado metafórico. Talvez seja pelo fato de nunca ter ido à Índia ou não ter visitado uma antiga república Soviética. Talvez tenha convivido pouco com um grupo Hare Krishna. Acredito, ainda, que pode ser pelo fato de ter assistido a poucos filmes iranianos ou não ter me envolvido como devia com a única música de origem afegã que ouvi.

Talvez possam ser outras coisas. Por isso, vou buscar ver agora os verdes campos do pampa gaúcho se cruzando com o azul do mar de Niterói. Tem gente que diz está vendo. Eu não vejo nada. Talvez esteja cego para isso e para tudo o que  às pessoas conseguem ver, menos eu.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Da arte de perder um feriado

Nessa vida, admito perder muita coisa. Já perdi livros e não chorei. Cds, discos, óculos, e me recuperei bem. Mas, para um bom brasileiro, perder um feriado é como perder alguém da família. É no nosso calendário com mais de um feriado em todos os meses do ano, que nós mostramos o quanto somos orgulhosos de termos nascido nessa terra abençoada por Deus e bonita por natureza.

Nós gostamos em ritmo alucinante de dias de ócio, regados a cerveja, churrascos e idas à praia. Não deveriamos nos aposentar por tempo de trabalho, poderiamos tranquilamente pedir aposentadoria por tempo de uso de havaianas, assim como já defendeu o Zé Simão.

O Brasil perdeu. Continua sendo penta e vai esperar mais quatro anos para virar hexa. Talvez essa não fosse mesmo a copa ideal para o Brasil ser campeão. Com o Galvão Bueno rouco, o grito de hexa não ficaria muito bem.

Terça-feira será um dia normal de trabalho. Os bares estarão mais vazios, as ruas menos verdeamarelas e o barulho das vuvuzelas cessarão a partir de hoje, para nunca mais voltar.

Isso foi uma puta sacanagem que a seleção fez conosco. Não precisava ser campeã, mas bem que poderia chegar até à final. A vida estava tão boa com as semanas mais curtas...

Nossos ídolos não são os mesmos e as aparências enganam

Aos poucos tenho me convencido que sou um descrente. Confesso, mesmo, que diante de tanta coisa que desafia a minha pouca inteligência, a descrença é o melhor dos artifícios. É como sobreviver na selva com apenas uma garrafa de água para passar quinze dias. Não posso me deixar corromper com brutalidades nos mais diferentes campos, e que parecem olhar pra mim e dizer: seu idiota, nós estamos aqui e você vai ter que nos engolir.

Eu não posso acreditar, por exemplo, que a Britney Spears é considerada cantora. Isso fere profundamente o meu código de ética, que classifica cantoras como aquelas mulheres de vozes potentes e produtoras em série de músicas ideais para ouvir entre uma cerveja e um petisco, vide Ana Carolina, Maria Gadú e Angela Roro, e que no campo dos relacionamentos transitam pelo universo do masculino e do feminino, com a mesma desenvoltura que pinguim caminha sobre o gelo.

Não posso, também, acreditar em horóscopo. Me recuso terminantemente em acreditar que hoje, por exemplo, o número da sorte é 17 e a minha cor é azul royal. Isso me soa como previsão de cartomantes do centro do Rio de Janeiro, que dizem nada com coisa nenhuma a partir do que você quer ouvir. Não acreditaria em horóscopo, mesmo lendo, nem que os astrológos me explicassem o seu complicadissimo e super fundamentado teoricamente método de trabalho.

Outra coisa que não consigo acreditar, é que cerveja preta é coisa boa. Comigo não rola. Cerveja tem que ser cerveja, loirinha, gelada e com uma fina camada de véu. Cerveja preta não é cerveja. E sobre isso eu não discuto, costumo chamar o garçon e pedir a conta.

P.S Em momentos onde só o álcool responde, o blogueiro já dançou ao som de Britney Spears e tomou cerveja preta, mesmo sem aprovar nem a música da Britney Spears e nem a cerveja preta. Como humano que é, ele corriqueiramente dá uma lida no horóscopo.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

A expansão dos cabelos brancos e a falta de dedos

Nos últimos tempos, tenho me dedicado com afinco a tarefa helênica de decifrar os enigmas que cotidianamente são apresentados pelos meus cabelos brancos. Durante uma longa fase da minha vida, os contei apenas nos dedos de uma mão. Com o passar dos anos só era possível realizar essa tarefa, que atesta a passagem do tempo, juntando os dedos das duas mãos.

Lembro, ainda, que durante muitos anos, dissimuladamente fingi ser possível contar com os dedos das mãos aquilo que só era possível contar se fossem utilizados os dedos das mãos e dos pés. Mas hoje já não sei mais como contar. Eles estão ai e a cada dia em maior número.

Sinto que eles querem dizer alguma coisa, passar alguma mensagem, mas ainda não fui suficiente inteligente para captar. Talvez eles estejam querendo mostrar tudo o que vivi durante esses 35 anos. Talvez tenha vivido demais, viajado demais, bebido demais, estudado demais, feito tudo em demasia. Mas custo a acreditar nessa hipótese. Nunca fui dos superlativos.

No índice de catalogação da espécie humana, sempre fui classificado como comedido e parcimonioso. Nunca acreditei em quem faz tudo em demasia. Alegria demais é uma coisa que abomino. Pra mim, quem é alegre demais o tempo todo está sentindo aquilo que Roberto Carlos define como "alegria triste".

Anacarolinamente falando, acho que eles estão querendo me mostrar que talvez eu devesse deixar de olhar o rio por onde a vida passa e tentar fazer a travessia, mesmo sem saber o que vou encontrar na outra margem.